Tratamento que envolve uso de lentes coloridas e filtros também não é suportado por evidências científicas
A Síndrome de Irlen ainda é um tema muito controverso na área da medicina. Até o momento não há nenhum estudo científico relevante que comprove a sua existência e a eficácia do tratamento proposto para essa suposta condição, que é feito com a utilização de lentes e filtros coloridos (overlays).
Principais Entidades Médicas não reconhecem a Síndrome
O Conselho Federal de Medicina, em 2014, publicou um parecer afirmando que faltam evidências científicas que justifiquem a prescrição de lentes e óculos coloridos, assim como não reconhece a existência da condição. O mesmo parecer foi publicado pela Academia Americana de Oftalmologia, no mesmo ano.
Antes disso, em 2011, a Academia Americana de Pediatria também se posicionou sobre o uso de lentes coloridas para tratamento da dislexia e outros distúrbios que afetam a aprendizagem. Segundo o documento, “não há evidências científicas que suportem os benefícios do uso de filtros ou lentes coloridas para o tratamento dos transtornos de aprendizagem. Não há evidências válidas de que as crianças que usam esse tipo de terapia respondem melhor ao aprendizado do que as crianças não as utilizam”.
Segunda Dra. Marcela Barreira, Oftalmopediatra, especialista em Estrabismo e Neuroftalmologista, é preciso muita cautela sobre o assunto, para não gerar falsas expectativas em um tratamento que não é reconhecido por nenhuma entidade médica, nem no Brasil e nem fora dele. “Uma vez que há dúvidas sobre a existência da Síndrome de Irlen, também há dúvidas sobre o tratamento”, disse a médica.
Nos últimos congressos da Academia Americana de Oftalmopediatria surgiram discussões sobre o tema e revisões de literatura que levaram a conclusão que não existe nenhuma evidência de que distúrbios de aprendizado estejam ligados a patologias oculares. Segundo o parecer da entidade, o diagnóstico e o tratamento dessas enfermidades devem ser feitos por equipes multidisciplinares e não pelo oftalmologista.
Tratamento da dislexia
“Uma das principais indicações das lentes coloridas é para o tratamento da dislexia. Porém, precisamos lembrar que os problemas visuais podem interferir no processo de leitura, mas não são a causa primária da dislexia”, explica Dra. Marcela.
De acordo com Dra. Karina Weinmann, neurologista infantil, a dislexia afeta as conexões cerebrais, levando a dificuldades para identificar letras e formar sílabas. “Sendo assim, não há embasamento cientifico que comprove a eficácia do uso de lentes coloridas ou de filtros para tratar esse transtorno da aprendizagem, nem os demais como disgrafia, discalculia, etc. O que contribui significativamente para isso é o diagnóstico precoce e as terapias com uma equipe interdisciplinar, composta por neurologista infantil, psicólogo, psicopedagogo, fonoaudiólogo e outros profissionais. Graças à neuroplasticidade cerebral, se o tratamento for iniciado precocemente, é possível restabelecer algumas conexões neuronais que são importantes para melhorar essas condições” explica a médica.
Para Dra. Karina, o mesmo vale para as outras condições que supostamente poderiam se beneficiar das lentes e filtros coloridos. “O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), assim como outros transtornos que surgem na infância, quando diagnosticados precocemente e tratados adequadamente, oferecem à criança a chance de desenvolver seu potencial máximo, principalmente se isso é feito nos primeiros anos de vida, fase em que há maior neuroplasticidade”, diz a médica.
Na prática não há melhora
Segundo Viviani Zumpano, neuropsicopedagoga e coordenadora pedagógica de uma escola tradicional de São Paulo, ela já teve contato com duas crianças: uma delas usava o filtro e a outra os óculos.“Na minha experiência não houve melhora do aprendizado. No começo, o objeto, no caso o filtro ou os óculos, podem dar à criança a sensação de segurança, mas na prática não há diferença nenhuma na aprendizagem. Precisamos ainda levar em conta o custo desse tratamento. Outro fator importante é que claramente essas duas crianças eram disléxicas, mas não tinham este diagnóstico. Supostamente tinham sido diagnosticadas com a Síndrome de Irlen”, comenta a especialista.
A prescrição dos óculos com lentes coloridas é enviada para os Estados Unidos. É lá que eles são produzidos e podem custar, aproximadamente, R$ 6 mil reais (2 mil dólares). Se a criança tem grau, ele precisa ser refeito a cada ano.
“A medicina é baseada em evidências e precisa de respaldo científico. Entendemos que os pais tendem a procurar os melhores tratamentos para as dificuldades de seus filhos, mas por desconhecimento podem acabar apostando em terapias que não são reconhecidas pela medicina e que podem atrasar o tratamento de fato adequado e que realmente é efetivo para ajudar a criança”, concluem as especialistas.
E só perguntar pra quem tem a Síndrome de Irlen e a melhora que teve depois de usar os filtros nos óculos ou o overlay.
Como é feito o diagnóstico de Dislexia?
Olá Raquel, boa tarde
A criança primeiramente é avaliada pela neuropediatra para descartar qualquer doença orgânica. Depois é encaminhada para diversas avaliações, com fonoaudióloga, psicóloga, neuropsicopedagoga e são realizados testes para confirmar o diagnóstico. Quem dá a avaliação final sempre será a médica, pois no Brasil o único profissional que pode dar diagnósticos é o médico.